segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

1814 em direção a 2008

De partida para mais uma viagem...

Vers Paris, vers Bruxelas, vers Ghent, vers Bruxelas, vers Lille, vers Paris, retour à Aix...

Vou conhecer o pais onde reencarnei pela primeira vez segundo a regressão que fiz uns anos atràs, a Bélgica. Não sei se devo acreditar ou se acreditei nisso realmente, até porque se a gente reencarna no ano de 1814, como pode estar usando calça jeans e jaqueta de couro dessas modernas??? Mas o que importa foi o que eu senti... nunca senti nada igual em toda a minha vida. E por isso talvez eu acredite.

Um jovem belga chamado Marques...

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Bref

Jà faz quase quatro meses que aqui estou em terras francesas, ou não. Terras mistas, fisicamente, culturalmente.

Nos ùltimos meses fiz muitas e muitas coisas. Apos o periodo dificil de adaptação, as coisas se acalmaram, mas veio um turbilhão de outras coisas, trabalhos, viagens, pessoas, amizades, "des-amizades", "inimizades", descobertas, mudanças.

Pra começar...

Assim que me alojei, logo na primeira semana no meu cafofo novo, tive a alegria de receber Erika. Passeamos um bocado pelo Luberon e Cassis, com a amiga dela, Hedlena, que mora em Grenoble e a Fernanda que morou em Aix e faz o mesmo curso que faço. Fomos de carro, GPS, e viva a modernidade! Isso foi em setembro. Nos perdemos, nos achamos, vivemos altas emoções no mar Mediterraneo no passeio pelos Calanques... Amei!







Depois veio periodo de calmaria... ou não. Passeei em Marseille e Arles...





Fui a Carcassonne e Barcelona com outra visita, esperada, mas também inesperada. Henrique quando partiu do Brasil disse que apareceria um dia por aqui, mas eu nem podia imaginar que seria tão ràpido. Quando eu disse que faria uma viagem nas minhas férias, tcharam! Nos encontramos em Carcassonne e depois fomos de là pra Barcelona. Viajar com Henrique é sempre uma diversão.






Depois veio a viagem de estudos em Montpellier de dois dias onde pudemos conhecer na pràtica os projetos urbanos franceses. As leis aplicadas na pràtica. Desenvolvimento sustentàvel.





Enfim, muito resumidamente, são as coisas pelas quais vim passando esses quatro meses, sem contar as desventuras, as crenças, descrenças, visão de mundo, cultura, etc, que talvez eu và contando em posts separados.

Les exercices de style

INDEFINIDO. O NADA E O TUDO

Chegaram, invisiveis, prontos para o nada ou despreparados para o tudo. Visao distorcida entremeada pela incerteza, pelas vontades do nada e do tudo. Olhar e palavras incertos, tortos, famintos, carentes, solitàrios. Je ne vais pas faire ce que tu ne veux pas. A la fin, c'est quoi ça? Cela, ne sert à rien. Impossivel o previsivel, possivel o imprevisivel. E alors? Alors, on oublie, on rêve. Et après? Afinal, não hà nada e nem tudo. Somente o infinito.

VERBO

Partiram. Uma flor no meio do caminho, sementes venenosas. Segura aqui, nao cai. Sobe ali, olha pra frente. Segura a àrvore, é outono. Continua. Chegaram. Sobe. Abre, fecha. Pàra. Cai. Cai. Olha. Fala. Olha, olha, olha...Abre, fecha. E agora? Passou. Quer saber. Esquece. Não hà nada. Olha, pensa, anda, olha, pensa, anda. Vai. Fica. Vai. Fica. Vai...

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Mais bizarrices francesas.

A higiene francesa é algo a desejar sim, seja higiene corporal, alimentar, dos ambientes. Aqui o povo mete a baguete (aquele pão comprido), sem a embalagem que o protege das intempéries e poluição, de baixo do braço, provavelmente jà meio fedido, e sai feliz da vida pra comer na sua casa que também não deve ser a mais limpa do mundo. Fazendo um parenteses, não vamos generalizar. Hà controvérsias e hà pessoas, lugares, comida, muito bem servidos e limpos. Ah, a comida… Putz, que saudade do arroz com feijão e dos restaurantes self-services do Brasil. Putz, saudade mesmo. Saudade do calor do inverno brasileiro, saudade de muita coisa. Aqui o estatuto de violencia é algo quase que inacreditàvel. Aqui a violencia para eles é alguém passar a mão na tua bolsa sem voce ter visto. Ou ser levemente agredido no metro por alguém que quer apenas sua bolsa. A cidade mais violenta da França é Marseille, que fica a quase 30 minutos daqui. O que é Recife então, Rio e São Paulo para eles ? O inferno ? A polìcia é eficiente e mesmo num roubo corriqueiro como o laptop de um estudante que foi roubado no alojamento, eles desvendaram o caso. Coletaram digitais no quarto e o cidadão foi preso.

A boa da night daqui é ir para uma boate onde não se paga nada, absolutamente nada para entrar, apenas o que se consome. Mas também é caro consumir. Então o que a maioria faz é beber em casa, ou nas milhões de « places » ou no Parc Jourdan, de preferencia um vinho, vendido nos supermercados de 3 a 5 euros em média e vinhos dos bons, e sair para um desses lugares. Ou seja, pouco ou nada se gasta e se diverte, sò que não hà muitas opções e os lugares são sempre lotados. Ou então mais barato ainda, reunir o povo na casa ou no quarto de alguém no alojamento e ficar là batendo papo a noite toda. Em todos os lugares pùblicos e fechados, como essas boates, é extremamante proibido fumar e todos respeitam. Aqui cidadão paga multa por estar em lugares não permitidos e agir incorretamente. Aqui todos acreditam em tudo o que voce fala. Dà até pena de contar uma mentirinha de vez em quando. Os franceses principalmente, não os imigrantes como eu, são todos muito inocentes. E dà para acreditar em tudo o que eles dizem. São todos muito cultos, não é à toa que a biblioteca municipal abre aos sàbados até 18h e fica lotada, mas também não abre às segundas. Mas as ruas sao uma grande lixeira... Aqui tem de modo geral, muita coisa boa, mas muita coisa ruim...

A questão da maldita idade, também é a bendita idade, porque fui a uma dessas boates com mais tres amigos, e o cidadão da portaria barrou a mim, somente a mim, me perguntando se eu era maior de 18 anos...rsrs... Eu disse: "Oui, merci". :), fiquei super feliz, ou nao! Deve ser porque os jovens de 18 tem cara de 30.

Aqui é voce quem faz tudo sozinho , sem ter o cara pra fazer pra ti: é voce quem tira a sua xerox na papelaria, quem abastece seu pròprio carro, quem é o proprio porteiro, e quando tem alguém pra fazer isso, essa pessoa é sozinha e faz mil coisas ao mesmo tempo : é quem prepara o lanche e a comida, é quem varre o salão, é quem recebe o dinheiro… disso também dà saudade do Brasil, de ter mil pessoas atendendo num restaurante, de ter um porteiro, do abastecedor de gasolina, de ter o cara que tira todas as xerox que voce precisa com a eficiencia e rapidez que eu nunca vou ter. Parece que as pessoas aqui vivem de verdade. Elas não tem esse estresse de cidade grande ainda. Trabalham sim e muito, mas vivem bem. Ah, tem a tal siesta onde em todos os lugares pùblico, lojas, etc, fecham às 12 :30h e sò reabrem às 14h. Putz, uma longa espera se voce tem pressa. Mas pressa pra que ?

Enfim, muita coisa, muito detalhe que eu vou escrevendo, se possivel, toda a semana.

Bizarrice!!

Ah, isso eu não posso deixar de relatar : logo no primeiro dia aqui, a Fernanda me levou pra conhecer um pouco as àreas ao redor da universidade. Aqui todo mundo te cumprimenta na rua, « bonjour » aqui, « bonjour » ali, principalmente se voce passa por alguém num lugar vazio ou diante da entrada e saìda de algum lugar. Daì passamos por uma passagem subterranea , um tanto bizarra a meu ver, porque não havia ninguém na rua. Daì um sujeito, jà com seus mais de 40 anos e até bem apessoado, apareceu do nada em cima da passagem e disse « bonjour ». Quando eu olhei pra cima ele estava com as calças abaixadas mostrando todo o seu potencial masculino. A Fernanda não tinha ouvido nem visto. Daì ele disse de novo « bonjour » e nem deu tempo de avisà-la. Ela olhou e continuamos seguindo nosso caminho. Bom, ele nada fez, logicamente, porque ele, como bem disse ela, não teria coragem de fazer nada. Ou teria? E me disseram que o povo não tem essa coisa da sexualidade. Se ele era frances ou não, pouco importa. Mas abri minha mente para ver que o mundo é mundo em qualquer lugar e é preciso arregaçar as mangas, não as calças. Mais da metade da população de Aix-en-Provence deve ser de estudante, muitas mocinhas e mocinhos bem intencionados, outros nem tanto. Todos muito jovens. Desse dia em diante passei a andar com meu bico de pato (uma pregadeira pontuda de metal que é capaz de matar um se atacado na jugular...rsrsrsr)na mão quando preciso passar por algum lugar esquisito e sozinha. Mas agora as redondezas da universidade estão mais povoadas e a cidade ferve de gente.

Il faut s'abriter

Visitei uns 10 apartamentos . Alguns muito velhos, outros mais ou menos velhos.Uns excelentes e caros, outros uma espelunca e também caros. Aqui tudo é velho, antigo. O que é novo é caro e o que é velho também é caro. Esses mais velhos, não sei os novos, possuem o vaso sanitàrio separado do resto do banheiro, como se voce estivesse na quarentena, de castigo, na solitària. Rsrsrs… Todos os proprietàrios, os mais velhos, mais rìgidos, exigem milhões de documentos, como no Brasil, claro, querendo saber se voce tem dinheiro. Se voce tem uma conta no banco, mesmo que vazia, pronto, voce tem dinheiro e pode alugar qualquer coisa. Mas pra voce ter uma conta bancària, tem que ter um atestado de residencia para poder receber as coisas do banco, ou seja, um cìrculo vicioso. Sem casa, sem conta no banco. Sem conta, sem casa. Enfim, um caos. Depois disso resolvido, e depois de muitas preces, encontrei o lar doce lar. Sim, uma fortuna se comparado ao alojamento universitàrio, mas enfim, nada aqui é barato, principalmente se voce tem mais de 28 anos e é estudante. A proprietària foi muito gentil. Comprou vàrias coisas novas, panelas, telefone, microondas, deixou até um cobertor, toalha, foi me buscar no alojamento de carro para me ajudar a pegar as minhas tralhas. E se esqueceu a um tempo não muito longo, penso eu, das burocracias que ela exigiu no anùncio.

Ah, o alojamento. Foi isso que me permitiu ter o atestado de residencia para abrir a conta no banco. Logo quando cheguei aqui fui pro alojamento, mas me assustei um pouco com tudo, pelo vazio do lugar, a mulher que me atendeu, pessoas, enfim. Daì a Fernanda, uma amiga que està fazendo o mesmo curso desde o ano passado, me segurou por 4 dias na sua casa. Mas depois saì de là e fui encarar o alojamento. Como era férias quando cheguei, estava tudo vazio. Mas tudo se saiu bem. Não é o melhor lugar do mundo para morar por um ano, mas quebra um galho se voce quer economizar. Ah, o banheiro é comunitàrio, homem e mulher, vaso e chuveiro sem distinção de sexo. Achei bizarro no inìcio, mas como me disseram que aqui as pessoas não tem essa coisa da sexualidade muito presente, encarei na boa. E foi simples. Tomei banho com o cara do chuveiro ao lado (fechado por divisòrias e não paredes, e portas, é claro), sem o menor problema. Esbarrei por pessoas no corredor enroladas na toalha… Depois de uma semana là, quando jà estava me acostumando com as coisas, conhecendo pessoas, fazendo amizades, tive que deixar o lugar. Maldita idade que vai chegando…. Mas como bem disse a Erika, amiga que eu hospedei por dois dias, meu cafofo novo é muito fofo e dà pra fazer uma mini-festinha aqui de vez em quando "sem muito barulho".

Primeiras semanas com a lingua...

As primeiras semanas desde a chegada foram bem difìceis, as 2 primeiras, mais precisamente. Apesar da facilidade em escrever e ler bem o frances, falar e compreender ainda são pra mim os grandes vilões da comunicação. Cheguei a cometer gafes que para qualquer frances que se preza, não perdoaria se voce marcasse com ele um horàrio, mas por ter compreendido outro, como trocar « seize heures » (dezesseis horas) por « six heures » (seis horas), voce não compareceu ao encontro marcado. Oralmente são quase identicas as horas. Ou mesmo chegar atrasado em qualquer ocasião. No inìcio, assim como ainda agora, em alguns momentos, quando eu falo com um frances que tem a lìngua presa ou que fala ràpido demais, eu pesco uma e outra palavra, junto tudo e balanço a cabeça como quem compreendeu. Isso funciona se o assunto é desses descartàveis, mas se não o é, como os assuntos administrativos de banco, de inscrições, aluguel, e todas as outras coisas que nesse inìcio estou tendo que fazer, tenho que abrir bem os ouvidos, como se ele estivesse gritando e querendo dizer : « fale mais devagar, eu preciso saber, isso é importante ! ». Mas na maioria das vezes ele se fecha e se cala, porque embora muito educados, os franceses não são là muito adeptos a ficar repetindo as coisas o tempo todo. E preciso ter uma tàtica para faze-los repetir a mesma coisa trocentas vezes. Mas agora, depois de um mes meus ouvidos estão mais abertos e jà é bem mais fàcil ouvir e ser ouvida.

Départ...

Trocar o certo pelo incerto não parece aos olhos de muitos uma decisão bem tomada . Mas fazer do incerto uma boa troca é uma decisão muito mais difìcil, principalmente quando o teclado frances não possui o grave e o circunflexo, como acentos da regra gramatical. Como se tudo na vida devesse seguir uma regra tão exata quanto a ortografia ou a matemàtica possam ser.

Bem, isso é apenas um ensaio de tudo o que fez parte de um momento em que era preciso agir com rigidez e ao mesmo tempo com a liberdade necessària para fazer do incerto uma troca sem os pré-conceitos do que é certo ou errado (o bom desse teclado é que existe uma tecla que tem o « é » jà acentuado, assim como o « è »). Como nòs acostumamos com quase tudo na vida, é fàcil assim fazer escolhas difìceis porque por tràs delas existe também esse caminho mais fàcil, como digitar « é », ou não é ?

As semanas que antecederam a partida « pour la France » foram, digamos, cheias de incertezas, medos, expectativas, alegrias, tristezas. Como se todas essas coisas, assim como milhões de outras, não fizessem parte da vida de qualquer ser humano com objetivos mais ou menos definidos. Como se os objetivos pudessem ser o tempo inteiro demarcados. Enfim, isso não importa. A decisão jà foi tomada. Isso é fato. Agora é seguir em frente e ver o que acontece.

quarta-feira, 16 de abril de 2008

Oiseau et pigeon


Essa foto foi captada num momento de reflexão...

Vim aqui te visitar, meu amigo, porque sei que que se sentes só, preso, sem saída. Se pudesse abriria sua jaula e te deixaria livre. Porém não viverias muito porque és pequenino e acostumado com seu mundinho. Eu sou grande, livre, tenho asas grandes e viajo cidades inteiras. Sou urbano, sei da vida, arrisco. Como de tudo e vivo intensamente. Sei de segredos e vivências que jamais saberás um dia. Tenho pena de ti, mas sei que já estás acostumado com essa vida e não te condeno por isso.
A cada um o cobertor que merece e se quer ter.

sábado, 15 de março de 2008

Diálogo do des-conhecido

- Olá, tudo bem?

- Tudo! Quem é você?

- Eu sou a mulher que vive em busca do sentido da vida. E você? O que fazes numa noite fria como essa, perambulando ao relento sem lenço e sem documento?

- Nossa! Mas uma mulher em busca do sentido da vida numa noite fria como essa? Não se esqueça de colocar um casaco. Você me parece uma pessoa um tanto certa do que quer. Tem certeza de que buscas mesmo o sentido da vida?

- Sim, senão não estaria aqui, só, caminhando por essas vielas escuras, procurando pelo desconhecido. Mas você não me respondeu... O que fazes aqui?

- Mas veja bem, você está procurando o desconhecido? O desconhecido não existe. Só procuramos o que conhecemos. Como pode querer encontrar o desconhecido?

- O desconhecido é aquilo que já está na nossa mente sem uma forma definida ainda... não existe de fato, mas ao tomar formas, torna-se conhecido, entende?

- Entendo...mas então o que queres de fato do desconhecido?

- Não sei, quero encontrá-lo e nele captar algo para mim.

- Hmmmm... muito insensato de sua parte querer captar algo do desconhecido sem mesmo conhecê-lo. Como acha que pode conseguir?

- Ah... não seja frio e calculista!!! Abra a sua mente e verás o desconhecido bem à sua frente. No fundo, todos sabemos o que queremos, mas não muito claramente. Mas não me contastes ainda quem é você e o que procura nessa noite fria e quase chuvosa.

- Certo! Não sou frio e calculista!!! Eu busco a verdade acima de tudo. E não posso encontrar a verdade no desconhecido.

- Mas é lógico que podes!!! Use a sua mente... é fácil demais. Quer ver?

- Quero!!! Você vai me ajudar a encontrar alguma verdade no desconhecido?

- Feche os olhos!

- Fechei! Agora imagine que aqui do seu lado tem um saco com muitas coisas dentro, mas você não sabe o que tem nele, apenas imagina. Você o vê, e pela quantidade e forma das coisas, sabe que dentro dele existem coisas que você pode pegar, mas ao mesmo tempo essas coisas não são suas e você não as pode pegar agora, apenas quando lhe derem, ok?

- Ok, quando então poderei pegá-las?

- Calma, apressado!

- Então, todas essas coisas são desconhecidas para você e não há nenhuma verdade nelas por enquanto. Imagine que essas coisas não são coisas palpáveis e sim coisas que você gostaria de viver daqui a algumas horas ou dias, semanas, meses ou anos, certo?

- Certo! Mas não posso fazer isso... Isso é futuro! Gosto desse instante agora que vivo com você! Imaginar o que vou fazer daqui a anos é muito longe e escapa das minhas mãos!

- Sim, mas pense, por mais que não queira... Mas espera aí! Vamos fazer diferente. Está vendo o saco com as coisas? Imagine que são coisas materiais com diferentes formas, mas você só vê as formas, ok? O que mais lhe agrada nas formas?

- Ah, agora sim. Eu vejo coisas quadradas, redondas, compridas, vejo retângulos, losangos, vejo estrelas, vejo bolas, vejo abajures, vejo mesas, cadeiras, vejo até uma cama pra dormir com você!

- Está vendo como quer algo?

- Estou brincando com você querida! Jamais dormiria com uma desconhecida, maluca que perambula em noites frias como essa buscando o sentido da vida e me fazendo de tolo!!!

- Quer fazer o favor de fechar os olhos e prestar atenção no que estamos fazendo?

- Ok, ok, ok. Você é quem manda, Dona Maluca!!!

- Associe essas formas que você vê com coisas que quer para si agora, certo?

- Xiiiii.... vai ser difícil isso. Você vai me achar um pervertido, um louco desvairado.

- Você disse coisas quadradas. O que está dentro do quadrado?

- Ah... Aí eu vejo uma cama pra dormir com você.

- E no redondo?

- A lua linda e maravilhosa que ilumina a nossa noite.

- E nas formas compridas?

- Ahahahahha! Bom, deixa pra lá!

- E os losangos?

- Esses são os balões que vemos no céu... As estrelas que vemos pela janela, como bolas coloridas, abajures iluminando o nosso quarto, mesas, cadeiras, paredes, lençóis!!!!

- Me solta! Seu louco, eu vou gritar... Socorro!!! Alguém me ouça!!! Tem um louco me pegando aqui!!!!

- Ah, fofa, calma... Ninguém vai te ouvir nessa noite fria quase congelando. Todos estão em suas casas, quentinhos, jantando, dormindo e fazendo carinho... Nós loucos estamos aqui racionalizando pedaços de vida, futuro que não existe, o desconhecido e a verdade que é mais falsa que qualquer outra coisa.

- Não me lembro como nos conhecemos, por que viestes falar comigo? Queria ficar só.

- Não gostou? Posso ir embora... Ali logo em frente tem alguém a esperar pela gente. Mas calma aí... quem veio falar comigo foi você, não se lembra??? Eu estava muito bem, no meu canto, pensando em como iria sobreviver só nesse frio e ia tomar uma bebida, quando você apareceu!!! Tchau então!

- Não, não vá!!! Fique! Não vou conseguir sobreviver nessa noite fria também.

- Por que estamos na rua? Por que não entramos naquele bar e tomamos algo quente?

- Não gosto de bares como esses dessa rua.

- Tens onde dormir?

- Sim, em casa.

- Por que não vais para casa então e fica refletindo sobre o sentido da vida lá... É bem melhor que aqui nesse frio.

- E você por que veio para a rua? Não tens casa?

- Tenho, mas vi você lá de cima e resolvi descer.

- Sério? Onde moras?

- Em cima de você.

- Mas como? Se nunca te vi?

- Você está sempre ocupada com suas coisas e na hora que você normalmente sai eu chego e por isso nunca nos encontramos. Está vendo aquela luz acesa ali em cima da sua jardineira? É o meu quarto aceso.

- Nossa, mas que coisa louca!!! Há quanto tempo mora ali?

- Faz três meses que aqui estou... E sei que você chegou a um mês de viagem, não é?

- Seu fofoqueiro!!! Como sabes disso?

- Eu vivo a vida dos outros... Gosto de sentir suas vidas como se fosse a minha. Tenho muitas vidas que queria viver guardadas dentro de mim. Mas não queria viver a sua vida... Você é muito pé nas nuvens.

- Mais pé nas nuvens que você não existe. Como pode viver pedaços de vida na sua mente?

- Vivendo oras. Por exemplo, está vendo aquele mendigo ali? Tenho um pedaço da vida dele e não quero nada mais pra mim... Sou um errante. Sou como as mulheres da vida e faço sexo só por prazer, sem amor e paixão. Sou o dono do bar e bebo tudo o que quero. Sou o estudante, pragmático, devoro livros. Sou o executivo, tenho muito dinheiro, viajo pelo mundo! Sou o porteiro que abre as portas para a vida dos outros. Sou um cantor e canto meu mundo no banheiro! Sou o ator e represento papéis como esse. E sou um louco!

- Ahahahaha, como você é tão louco como eu... Já buscou então o sentido da vida com todos esses personagens que você cria no seu mundo?

- Mas pra quê o sentido da vida ?? O que é vida, me diz???

- A vida? Bem, a vida é essa coisa que nos move, que cria nossos pensamentos, que invade o coração, que nos alegra, que nos entristece, que nos exalta... A vida é o pulsar do instante. A vida para mim é também o amor, amizade...

- Amor? Mas que coisa romântica! Esqueça do amor e não terás mais vida? Você não sabe o que é a vida e nem muito menos o amor.

- Então me digas. O que sabes da vida e do amor?

- Aahhahahhah... Você me fazendo esta pergunta?

- Sim, responda, rápido!!!!

- A vida é o olhar. Se eu consigo olhar, eu vivo.

- E se fechas os olhos? Não vives?

- Quando fecho os olhos eu amo.

- Não amas de olhos abertos? E não vives de olhos fechados?

- Não.

- Ok, deixe-me embora... já perdi tempo demais com esse bla, bla, bla. Está frio e preciso dormir... Tchau!

- Juras que vai me deixar aqui de olhos abertos olhando pra você indo embora sem poder fechá-los e amar-te? Venha, segure a minha mão. Esqueça o sentido da vida, esqueça o desconhecido e a verdade. Não existem verdades, nem mesmo desconhecidos, somente a vida. Então viva essa vida.

- Opa! Calminha. Esse instante que vivo com você foi um dia desconhecido para mim e agora se tornou uma verdade e estamos vivendo, porque a vida pra mim é o pulsar do instante.

- Ok, vejo que nos completamos então.

- Não acredito que opostos se atraem. Você é um chato! Odeio esse seu jeito meio estranho de ser, com essa sua voz trêmula, aguda, irritante! Não posso viver essa vida com um ser que me bisbilhota da janela.

- Eu, estranho? Mais estranha que você, só você mesmo. Sua complicada! Te bisbilhoto porque gosto do seu jeito atrapalhado de colocar o sutiã. De tomar banho com sabão de coco e de não pentear os cabelos. Gosto de te ver dormindo de pijamas de seda com lençóis de cetim. Vivo essa vida sua como se também fosse a minha. Por isso te quero do meu lado... Venha, me dê as mãos...

- O quê???? Como posso dar as mãos para um bisbilhoteiro de primeira classe! Vou te entregar à polícia...

- Pra quê?! Agora quem não quer mais perder tempo sou eu... Tenho sono e não posso mais ficar aqui ouvindo esse discurso de uma louca que vai passar o resto da vida buscando o sentido da vida... Tchau!!!

- Tchau então... vá para o seu quarto escuro e nunca mais terás a minha janela como pano de fundo para essa sua vida medíocre através dos outros...

- Deixa de ser maluca. Estou te chamando para a minha vida. Por que não vens?

- Porque, porque, porque... O sentido da vida que busco acaba aqui. Não quero mais buscá-lo... Quero vivê-lo.

- Não sei então porque ainda buscas o sentido da vida. Você já descobriu... Agora agarre-se nela e viva, de preferência comigo..

- Mas me diga, quem é você? Ainda não me respondeu...

- Eu???? Você não sabe? Já te disse! Eu sou você quando buscares o sentido da vida... Eu sou um pedaço de ti arrancado pela sua ignorância em não me aceitar.

- Você acha mesmo que vou te aceitar?? Não sejas tolo!!!

- Mas por quê?? Me digas!!! Por quê?

- Porque o sentido da minha vida não está em ti, não é você. Um louco desvairado que anda por vielas escuras e frias noites... E além do mais, o sentido da vida não pode estar em uma pessoa. Ele é muito mais que isso. Está envolto em algo muito superior a isso.

- Olhe quem fala. Quem saiu por aí por ruas frias e escuras divagando sobre o sentido da vida? E, nossa, mas pra quê filosofar tanto sobre isso. Coisas superiores... É tudo tão simples assim...Você já descobriu o sentido da vida, já sabe o que é a vida, mas não se encontrou no desconhecido... O desconhecido!!!!! Veja... Quem é o desconhecido???? Esse ser que te aparece repentinamente sem pedir licença, que lhe fez refletir sobre o sentido da vida, que acabou de te mostrar que a vida é tudo aquilo que você disse há menos de um minuto... Eu te disse, eu te mostrei o sentido da vida. As palavras se saíram como os pássaros sobrevoam o mar, cantando alegremente, como o sol que grita de calor, como a chuva que espirra com sua força, como o barulho das ondas e das árvores balançando... Você se encontrou na vida e o desconhecido sou eu...

- Mas e a verdade que tu buscas? Encontrastes?

- A verdade, minha querida, é isso que agora vivo com você, somente isso... O que há mais de verdadeiro nisso? Você é a minha verdade neste momento presente... Venha, vamos cantarolar por aí, esquentar nossos desconhecidos e ver que o sentido da vida é tudo o que nos completa...Venha... Lá, lá, lá... Vamos sonhar juntos... Lá, lá, lá...

quarta-feira, 5 de março de 2008

No hay camino, se hace camino al andar.

POEMAS PORTUGUESES ( 4 )

Nada vos oferto
além destas mortes
de que me alimento

Caminhos não há
Mas os pés na grama
os inventarão

Aqui se inicia
uma viagem clara
para a encantação

Fonte, flor em fogo,
quem é que nos espera
por detrás da noite ?

Nada vos sovino:
com a minha incerteza
vos ilumino

(Ferreira Gullar)

Um professor da faculdade ensinava que era inútil a arte de projetar caminhos em grandes parques, praças, jardins, etc, porque por mais que se criassem caminhos pré-determinados que ligassem dois espaços distintos, esses caminhos eram sempre burlados pelas pessoas. De um certo modo, e na maioria dos casos, é verdade. Em Brasília, por exemplo, os caminhos se formaram naqueles grandes gramados das ruas, espontaneamente. Por mais que calçadas e caminhos estipulados tivessem sido pensados "corretamente", os pedestres (que hoje, apesar do projeto da cidade voltado para o automóvel, já são muitos percorrendo grandes distâncias), criam esses caminhos diariamente. Eu mesma os utilizei quando estive lá e me foram mais úteis que as próprias calçadas, "bem-planejadas". As pessoas sabem o que se torna melhor para elas mesmas quando o dia-a-dia lhes permite tal indagação.

Pois bem... indagações à frente, o poema de Gullar se inspirado em Antonio Machado ou independentes entre si, é uma arquitetura da vida e na vida. Não faremos nossos caminhos determinados e pautados no que todos determinam que seja o mais correto. Sabemos, somente nós, individualmente, onde o próprio caminho quer levar. Mil voltas são dadas na promenade arquitetural, levando todos ao mesmo lugar - pleonasmo desnecessário. Mas caminhos projetamos ao futuro de algum modo. Sabendo ou não o que se quer ou onde se quer chegar ou como chegar, a algum lugar se chega no caminho, mas antes ver onde se quer chegar. Muitas são as promenades arquiteturais. Perde-se ou ganha-se tempo, mas lá se vai estar um dia. É preciso o caos interior para descobrir que era lá onde se queria estar, sempre foi.

É preciso madurar o caminho na grama até que ele esteja feito. Muitos por ali terão de passar.


Caminante, son tus huellas
el camino y nada más;
Caminante, no hay camino,
se hace camino al andar.
Al andar se hace el camino,
y al volver la vista atrás
se ve la senda que nunca
se ha de volver a pisar.
Caminante no hay camino
sino estelas en la mar
(Antonio Machado)

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Meu trono, meu mundo

Ele acordou hoje ao mesmo tempo perdido e exaurido pela possibilidade de mudanças. Foi até a banca de jornal, vasculhou as notícias e lá estava ela. "Uma hora esse 'eterno' trono seria desmantelado", pensava ele. Enfim... A igualdade perante os homens em nossa sociedade será dissolvida por poderes abaláveis pelo capital. "Quero crescer! Quero dinheiro, quero progredir! Meu país não me permite!". Mas sua crença numa sociedade mais ambiciosa é superior ao que eu somente preciso ter para minha sobre-vivência*. "Mas eu quero mais, quero poder ter carros do ano, um bom apartamento, quero poder ter mais, quero ganhar mais". Até onde você irá? Sociedades capitalistas pelo mundo inteiro têm tudo o que você quer e mais, muito mais pobreza e desigualdade, têm muitos milionários e muita miséria, violência. "Mas eu quero experimentar". Quem sabe não experimentarás um dia. Não precisará ir muito longe. Fidel, fiel aos seus princípios e ser humano, não é armadura, é carne e osso. Um dia seria abalado. Não é deus, mas construiu uma sociedade ainda que igualitária, sem muitas perspectivas de crescimento e liberdade individual, e a sociedade sentiu na pele muita dor e dificuldade. "Então...não precisarei sair, viverei isso aqui mesmo e terei o que contar aos meus sucessores, toda uma história e eles vão rir da minha cara e me questionarão como eu pude sobreviver a toda essa irrefutável conduta de vida."
Refutável até hoje. Suas idéias sempre foram contestadas. E esse suposto declínio abrirá, mas também fechará muitas portas. Não se iluda.

*
não é erro de ortografia

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

Sucateando a arte, no mundo


A vilã da arte rouba a cena. Primeiro no Brasil, depois na Suíça. Estou há dias para falar sobre o sucateamento da arte. Sucateamento? Mas o que é arte afinal? Uma discussão dessas sem fim, como religião e futebol. Funk é arte? Futebol é arte? Picasso é arte? Niemeyer é arte? Arquitetura é arte?

Ainda bem que as telas também foram roubadas na Suíça, porque aí tiramos das costas a culpa e aquela frase "só podia ser brasileiro". Aqui também fala-se alemão e se foi um alemão que roubou as telas na Suíça, ele também bem que poderia falar um português mais ou menos. Li uma vez que a arquitetura não tinha o valor que uma pintura tem, ou que uma obra de arte, uma escultura têm. Arquitetura é coisa pra ser vivida, sentida com as suas quatro dimensões. É mais rica que uma pintura, por ser parte da experiência, cheiro, tato, visão e audição. O tempo, quarta dimensão, é o tempo do real, do momento que será diferenciado por outro e mais outro e outro. O sol do meio-dia é diferente do sol das 18h. Um monumento ao meio-dia é outro às 18h. E a pintura?

A pintura é generosa, num quarto é uma coisa na sala é outra. Não descarto seu valor, mas poderia ser mais baixo não? Milhões de dólares num espaço de 60cm x 60cm? E o espaço de obras arquitetônicas tão ricas, espaços de mais de mil metros quadrados? Se eu pudesse levava pra casa. Talvez uma maquete do MAC valha tanto quanto uma pintura de Cèzanne. Ou o Museu do Louvre. Ou não...

O que leva o nome da arte? O autor? Ou seu poder sobre os outros? Século XXI e a arte de séculos passados está aí. A arquitetura também. Mas quem vale mais? O que farei com telas de pintores mortos? Sucata... no mínimo, ou milhões de dólares... melhor gastá-los vendo arquiteturas do mundo e quem sabe uma tela de Picasso no museu do Louvre. :)

segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Volta, sim!

Ganeshita,

Não te abandonei... Estou apenas ligeiramente enrolada com outras coisas, mas eu voltarei, com muito, mas muito mais!!! Muahahahahhah... (adoro isso ... :) )

Chuva + 2a. feira + Rio de Janeiro = (engarrafamento + caos - rotina) ² x 999999 + resistência / paciência

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sábado, 5 de janeiro de 2008

Frestas abertas

Ela acorda todos os dias às seis horas da manhã e faz tudo sempre igual... Nada de novo. As mesmas pessoas, o mesmo caminho, o mesmo lugar, batendo a cabeça na parede, tum, tum, tum. Nada se cria, nada se transforma. Olha ao redor encontra os mesmos seres, o mesmo outdoor, a mesma janela. Todos seguindo sempre seus mesmos passos. Corre aqui, veja lá, entre aqui, saia ali. E sobe aqui, senta ali, olha aqui, levante daí, vai lá, pega, lê, faz, senta ali, olha aqui, levanta, senta, ouve. Grita? Não. Saia daqui, vai lá, corre, esquece, joga, levanta e não volta. Mistura tudo. Faz diferente. Roda, roda, roda. Bate a cabeça na parede. Quebra. A parede, não a cabeça. Bate. Quebra mais uma vez, outra vez. Olha. Uma fresta. Quebra, outra fresta. Grita! Chegou a hora!

Conversava com um amigo sobre caminhos e lugares e me veio essa inspiração para descrever movimentos de mudança, de atitudes, de novos caminhos e novos lugares. Não lugares e caminhos necessariamente físicos, mas no meu entendimento caminhos que nos levariam a algum lugar, seja ele em prol de uma situação, ou de um desejo maior, ou mesmo do seu próprio entendimento do que é sua vida. E nesse mundo onde o que vem contando é a passagem do tempo segundo números, cabe uma reflexão muito profunda. Não me importa se passou de 7 para 8, mas se em sete grandes coisas pude fazer mais uma... por mim, ou pelas pessoas, ou pelo infinito de pequenos momentos diários. Se vou ao supermercado e compro um único produto e não o levo na sacola e sim dentro de minha bolsa. Ou se já levo a sacola de ontem hoje de novo. Pronto, essa passou a ser minha mínima contribuição perante o meio em que estamos inseridos. Fechar a torneira do chuveiro enquanto é a vez do sabão. E segue por aí. (Legal é ver a cara das pessoas vendo você colocar um sabonete que acabou de comprar dentro de sua bolsa... ou o cara do caixa achar estranho você retirar todas as sacolas da sua bolsa para colocar suas compras....)

Reverter um quadro colocando-o de cabeça pra baixo pode nos dar uma visão um pouco estranha, mas com o tempo passa ser mais fácil lidar com isso. Ver a vida por um novo ângulo. E daí dele não se quer sair mais. Quando encontrar esse lugar ou caminho, (como queira B.), e entendê-lo através de um novo ângulo, quem sabe a contagem do tempo não fará mais sentido. Tudo é um ciclo que se renova. Legal é poder ter liberdade e discernimento para mudar.

Anos não se contam, eles no fundo não existem. São como frestas abertas para novos caminhos, ou lugares.